sexta-feira, janeiro 05, 2007

Aparição (2)

Convences a quietude primordial
da caneta a descobrir o caminho das
vozes que afagam uma memória
silenciosa. Permites-me ver-te
a face escondida na bruma do medo,
obrigando-me ao receio de fabricar uma lembrança
que nunca existiu e que se inventa de novo.
É como se ganhasses vida própria,
sem que nem eu nem essa caneta consigam
orientar o vento que da folha escrita advém.
És força sem motor nem combustível,
uma vontade autónoma, um fogo que arde
sem que ninguém o inflame.
Sei que existes porque assim o ditas,
porque a vontade de te dizeres é
o meu desejo de te consumir.


Miguel Godinho

Enquadra-se na série de aparições do sulscrito.

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