Aqui agora para sempre
Escondíamo-nos das palavras débeis
que nos definiam
e borrávamos o texto que escreviam aqueles
cujas canetas compunham
pesadas arquitecturas imaginadas
tentámos apenas uma vez
abrir o livro que
contava a história das nossas infâncias
e compreendemos os passados de cada um
Foi assim que a desconexão do mundo
nos colocou no mesmo tabuleiro
e eis que nos encontramos aqui agora
para sempre
Miguel Godinho
quarta-feira, janeiro 31, 2007
terça-feira, janeiro 30, 2007
A minha morada
Revelar na dor do Ser
o estimado e imprevisto regaço
indefinido presente na imaculada
sensação de constância
- um empenho inscrito no desejo constante
de retorno ao desgosto criativo de sensações
cálidas e genuínas
Estranhas a minha tendência
para o negro, ainda que saibas que
é essa a minha morada, ainda que custe a
crer na terna doçura que é a melancolia,
essa suave brisa de sensações
cálidas e genuínas
Miguel Godinho
Revelar na dor do Ser
o estimado e imprevisto regaço
indefinido presente na imaculada
sensação de constância
- um empenho inscrito no desejo constante
de retorno ao desgosto criativo de sensações
cálidas e genuínas
Estranhas a minha tendência
para o negro, ainda que saibas que
é essa a minha morada, ainda que custe a
crer na terna doçura que é a melancolia,
essa suave brisa de sensações
cálidas e genuínas
Miguel Godinho
segunda-feira, janeiro 29, 2007
sexta-feira, janeiro 26, 2007
quinta-feira, janeiro 25, 2007
Um texto que se reescreve
Há um texto que nos acompanha
toda a vida qual escultura que se
vai talhando. Uma peça de barro que
se modela sem que nunca se ajeite
um assunto que nunca se finaliza, que
jamais se encerra, um tema sem tema.
Esse texto escreve-se com o passar dos anos
é o vento que o pontua, a chuva que
o desfigura e o sol que alvitra
a luz que lhe corrige e castiga os erros.
Todos temos um texto que se reescreve
que se apaga, que não queremos finalizar
demorando a caneta, tentando que
não perca a tinta e que alguém consiga
entender a caligrafia por vezes nervosa
por vezes impaciente, por vezes excitada
Como se a vida se pudesse escrever
num mesmo texto, como se
o texto fossemos nós.
Miguel Godinho
Há um texto que nos acompanha
toda a vida qual escultura que se
vai talhando. Uma peça de barro que
se modela sem que nunca se ajeite
um assunto que nunca se finaliza, que
jamais se encerra, um tema sem tema.
Esse texto escreve-se com o passar dos anos
é o vento que o pontua, a chuva que
o desfigura e o sol que alvitra
a luz que lhe corrige e castiga os erros.
Todos temos um texto que se reescreve
que se apaga, que não queremos finalizar
demorando a caneta, tentando que
não perca a tinta e que alguém consiga
entender a caligrafia por vezes nervosa
por vezes impaciente, por vezes excitada
Como se a vida se pudesse escrever
num mesmo texto, como se
o texto fossemos nós.
Miguel Godinho
quarta-feira, janeiro 24, 2007
É um vírus em mim
É um vírus em mim
uma máquina que labuta
e desconexa
um pensamento que acorda violenta e
afronta a razão que me prende
suavemente constantemente
É assim que esqueço que o anseio sempre
me avassala
é um desejo que não alcanço
uma intenção deliberada
uma peçonha
uma luta essencial que
se ganha hoje e se
desbarata amanhã
É um vírus em mim
Miguel Godinho
É um vírus em mim
uma máquina que labuta
e desconexa
um pensamento que acorda violenta e
afronta a razão que me prende
suavemente constantemente
É assim que esqueço que o anseio sempre
me avassala
é um desejo que não alcanço
uma intenção deliberada
uma peçonha
uma luta essencial que
se ganha hoje e se
desbarata amanhã
É um vírus em mim
Miguel Godinho
segunda-feira, janeiro 22, 2007
O dilatar das pupilas
Não estranhei o dilatar das pupilas nem
a ausência que sempre adornou o sentir
uma incomunicabilidade latente
numa fadiga de axilas receosas
desta vez seria diferente, poderia ter sido
uma dor exígua num espaço vulgar
quase sempre o mesmo, perpetuamente indistinto
uma sensação estranha, imperturbável
um embrulho que se paga caro
uma vida que deixa de o ser
um ardor
Sinto que breves se tornam as memórias
e os rasgos da calosidade da alma
fazem-me experimentar
estes nocturnos pesares, insuportáveis
e é assim que por breves instantes
desço do extâse e caio em desgraça
no imenso mar de uma dor que é
existir desta forma.
Miguel Godinho
Não estranhei o dilatar das pupilas nem
a ausência que sempre adornou o sentir
uma incomunicabilidade latente
numa fadiga de axilas receosas
desta vez seria diferente, poderia ter sido
uma dor exígua num espaço vulgar
quase sempre o mesmo, perpetuamente indistinto
uma sensação estranha, imperturbável
um embrulho que se paga caro
uma vida que deixa de o ser
um ardor
Sinto que breves se tornam as memórias
e os rasgos da calosidade da alma
fazem-me experimentar
estes nocturnos pesares, insuportáveis
e é assim que por breves instantes
desço do extâse e caio em desgraça
no imenso mar de uma dor que é
existir desta forma.
Miguel Godinho
domingo, janeiro 21, 2007
sexta-feira, janeiro 19, 2007
quinta-feira, janeiro 18, 2007
Primeiramente
Aquilo que procuro primeiramente ao ler um poema não é perceber o que o poeta estava a sentir ao escrever o texto. Pretendo sim que o poema me transmita algo, que me desperte algum tipo de emoção, que comunique comigo, que me acenda uma luz interior. No fundo, quero que o poema seja capaz de me arrancar algum tipo de agitação interior – é dessa forma que entendo que se deva processar o primeiro contacto. No fundo, espero que o poema me transmita uma imagem emotiva, sensorial. Primeiro o poema comunica comigo, por si só. Depois e só depois, o poeta e o seu poema.
O mesmo se aplica à pintura, à escultura e a todas as artes. É a obra isolada que deve comunicar primeiramente e não o artista. Para mim, o valor da obra reside nela mesma. Só depois me interesso por contextualizar a obra na vida, no sentir do artista. É certo que tudo na vida tem um contexto e deve ser entendido como tal, mas também é certo que a arte tem o poder de se abstrair do seu contexto para se fazer valer autonomamente. Porque no fundo, o seu contexto somos nós e não apenas quem a executou.
O mesmo se aplica à pintura, à escultura e a todas as artes. É a obra isolada que deve comunicar primeiramente e não o artista. Para mim, o valor da obra reside nela mesma. Só depois me interesso por contextualizar a obra na vida, no sentir do artista. É certo que tudo na vida tem um contexto e deve ser entendido como tal, mas também é certo que a arte tem o poder de se abstrair do seu contexto para se fazer valer autonomamente. Porque no fundo, o seu contexto somos nós e não apenas quem a executou.
Miguel Godinho
quarta-feira, janeiro 17, 2007
Amanhã quem sabe
Há uma arrogância excessiva na
forma do mundo olhar o mundo
Uma alienação aflitiva que absorve
e nem mastiga
o ruído disforme da cidade
É como que um indiferença que
impressiona pela imoralidade latente
Vidas que se corrompem
umas às outras sem que se apercebam
minimamente, descaradamente, evidentemente.
No entanto
Marcamos constantemente o compasso desta rotina
e cumprimos todos os dias à regra
o toque do alarme das oito
prometendo uma e outra vez que
não enlouquecemos hoje
amanhã quem sabe
Que palco este em que nos encontramos
de manhãs difíceis e tardes melancólicas,
hoje, amanhã e depois
é tão evidente quanto pagar impostos
e acabar deitado numa cama
oito palmos abaixo desse mundo
que olha o mundo com olhos de confiança
como se tudo fosse fácil de entender
Como se amanhã tudo se tornasse mais fácil...
Miguel Godinho
Há uma arrogância excessiva na
forma do mundo olhar o mundo
Uma alienação aflitiva que absorve
e nem mastiga
o ruído disforme da cidade
É como que um indiferença que
impressiona pela imoralidade latente
Vidas que se corrompem
umas às outras sem que se apercebam
minimamente, descaradamente, evidentemente.
No entanto
Marcamos constantemente o compasso desta rotina
e cumprimos todos os dias à regra
o toque do alarme das oito
prometendo uma e outra vez que
não enlouquecemos hoje
amanhã quem sabe
Que palco este em que nos encontramos
de manhãs difíceis e tardes melancólicas,
hoje, amanhã e depois
é tão evidente quanto pagar impostos
e acabar deitado numa cama
oito palmos abaixo desse mundo
que olha o mundo com olhos de confiança
como se tudo fosse fácil de entender
Como se amanhã tudo se tornasse mais fácil...
Miguel Godinho
terça-feira, janeiro 16, 2007
O que é a Aparição?
Primeiro olho a folha em branco, depois sinto o perfume que dela brota, seguindo com a caneta os sinais indiciadores de uma presença que lentamente se assoma para finalmente se anunciar. De onde surgem estas inscrições com que marco as páginas? De onde provém a ideia que me força a exprimi-la? Que força é esta que me impele a borrar esta folha com um texto que há pouco não estava destinado a existir?
Importa perceber os mecanismos que levam este desejo (o qual existe primeiramente enquanto nada, depois sob a forma de ideia para por fim convocar obsessivamente a necessidade de materialização sob a forma de texto escrito) a tornar-se verdadeiramente um desejo. Porque primeiramente o desejo não existe, nem a concepção que o formula. Primeiro existe uma paz, depois um tormento, como se inicialmente fosse um sossego e posteriormente uma necessidade para, por fim, se tornar inteligibilidade. Que reacções se desencadeiam na mente para que sejamos compelidos a exprimir uma concepção, neste caso sob a forma escrita?
É o momento da inscrição, que se segue ao inferno da confrontação do moldar da ideia, que define a aparição. Primeiro o nada, depois a necessidade de confrontação para finalmente se permitir a inscrição. Quietude, pensar, inferno, beatitude. Primeiro a folha em branco, depois a necessidade seguida do confronto para finalmente se concretizar o registo.
O que sente uma pessoa no momento da aparição? Que luz é essa e de onde vem? De onde provirá esse rasgo de anunciação que subitamente nos assola, reclamando uma ordenação?
A aparição é o momento em que a ideia é expressa, em que a mesma se inscreve, ordenada. A aparição é a materialização (sob que forma seja) da ideia barroca, disforme e (ainda) incompreensível. A aparição é este texto que agora existe no papel e que anteriormente existia em bruto na minha cabeça. E que antes ainda, nem sequer existia.
Miguel Godinho
Primeiro olho a folha em branco, depois sinto o perfume que dela brota, seguindo com a caneta os sinais indiciadores de uma presença que lentamente se assoma para finalmente se anunciar. De onde surgem estas inscrições com que marco as páginas? De onde provém a ideia que me força a exprimi-la? Que força é esta que me impele a borrar esta folha com um texto que há pouco não estava destinado a existir?
Importa perceber os mecanismos que levam este desejo (o qual existe primeiramente enquanto nada, depois sob a forma de ideia para por fim convocar obsessivamente a necessidade de materialização sob a forma de texto escrito) a tornar-se verdadeiramente um desejo. Porque primeiramente o desejo não existe, nem a concepção que o formula. Primeiro existe uma paz, depois um tormento, como se inicialmente fosse um sossego e posteriormente uma necessidade para, por fim, se tornar inteligibilidade. Que reacções se desencadeiam na mente para que sejamos compelidos a exprimir uma concepção, neste caso sob a forma escrita?
É o momento da inscrição, que se segue ao inferno da confrontação do moldar da ideia, que define a aparição. Primeiro o nada, depois a necessidade de confrontação para finalmente se permitir a inscrição. Quietude, pensar, inferno, beatitude. Primeiro a folha em branco, depois a necessidade seguida do confronto para finalmente se concretizar o registo.
O que sente uma pessoa no momento da aparição? Que luz é essa e de onde vem? De onde provirá esse rasgo de anunciação que subitamente nos assola, reclamando uma ordenação?
A aparição é o momento em que a ideia é expressa, em que a mesma se inscreve, ordenada. A aparição é a materialização (sob que forma seja) da ideia barroca, disforme e (ainda) incompreensível. A aparição é este texto que agora existe no papel e que anteriormente existia em bruto na minha cabeça. E que antes ainda, nem sequer existia.
Miguel Godinho
quinta-feira, janeiro 11, 2007
Por vezes dou por mim a tentar perceber o presente. Parece que de repente me escapa o passado, como se me tirassem o tapete da memória debaixo dos pés. Paro, escuto e não ouço a memória. E então tenho de aguardar que ela regresse, como se esta fosse autónoma, como se tivesse vida própria. Sou eu a tentar aceder a um ficheiro da memória, eu a tentar aceder a mim. Um pouco à semelhança do que acontece com os computadores, quando não respondem de imediato a uma ordem e ficam a pensar até que finalmente executam a operação. Por vezes qualquer coisa corre mal e é necessário encerrar a operação para executá-la de novo. Há ficheiros que por vezes não abrem porque se danificam, sem que ninguém lhes mexa. A memória é isso mesmo. Uma série de ficheiros que necessitam de uma duplicação de suportes para que não se danifiquem e se percam. Convém reproduzi-los materialmente para que isso não aconteça. A escrita pode cumprir essa função.
Miguel Godinho
quarta-feira, janeiro 10, 2007
Sinto que o meu destino se define como um gato que trepou uma árvore e escolheu um galho para se sentar porque lhe pareceu bem, a dada altura. Acomodou-se bem para que não caísse, para se aquecer convenientemente e ali ficou. Não se interessou muito se o galho do lado oposto da árvore era mais confortável, talvez viesse a experimenta-lo um dia, talvez não, who cares? Enquanto aquele galho não se partisse e enquanto se sentisse confortável, ali permaneceria.
Miguel Godinho
segunda-feira, janeiro 08, 2007
A sombra de uma luz fugidia
na memória – a tua face
Cor revelada numa
forma nocturna – o teu corpo
Epígrafe tatuada numa
derme sensível– o teu nome
Vapor etílico de noites
estratégicas – o teu cheiro
Reconstruo o castelo que te define
numa alvenaria de pedra disforme e
recupero a muralha caída que
o nosso tempo abandonou.
É assim o teu novo Ser:
uma calma póstuma,
uma fortaleza melindrosa que
apenas permanece
numa ideia nostálgica.
Miguel Godinho
na memória – a tua face
Cor revelada numa
forma nocturna – o teu corpo
Epígrafe tatuada numa
derme sensível– o teu nome
Vapor etílico de noites
estratégicas – o teu cheiro
Reconstruo o castelo que te define
numa alvenaria de pedra disforme e
recupero a muralha caída que
o nosso tempo abandonou.
É assim o teu novo Ser:
uma calma póstuma,
uma fortaleza melindrosa que
apenas permanece
numa ideia nostálgica.
Miguel Godinho
sexta-feira, janeiro 05, 2007
Aparição (2)
Convences a quietude primordial
da caneta a descobrir o caminho das
vozes que afagam uma memória
silenciosa. Permites-me ver-te
a face escondida na bruma do medo,
obrigando-me ao receio de fabricar uma lembrança
que nunca existiu e que se inventa de novo.
É como se ganhasses vida própria,
sem que nem eu nem essa caneta consigam
orientar o vento que da folha escrita advém.
És força sem motor nem combustível,
uma vontade autónoma, um fogo que arde
sem que ninguém o inflame.
Sei que existes porque assim o ditas,
porque a vontade de te dizeres é
o meu desejo de te consumir.
Miguel Godinho
Enquadra-se na série de aparições do sulscrito.
Convences a quietude primordial
da caneta a descobrir o caminho das
vozes que afagam uma memória
silenciosa. Permites-me ver-te
a face escondida na bruma do medo,
obrigando-me ao receio de fabricar uma lembrança
que nunca existiu e que se inventa de novo.
É como se ganhasses vida própria,
sem que nem eu nem essa caneta consigam
orientar o vento que da folha escrita advém.
És força sem motor nem combustível,
uma vontade autónoma, um fogo que arde
sem que ninguém o inflame.
Sei que existes porque assim o ditas,
porque a vontade de te dizeres é
o meu desejo de te consumir.
Miguel Godinho
Enquadra-se na série de aparições do sulscrito.
quinta-feira, janeiro 04, 2007
O silêncio [2]
O silêncio não é vazio
penetra no mar de nós
navega por entre sentires
naufraga nas conjecturas
O silêncio é angular
uma estrada que não se conhece
um mapa desactualizado
um trilho que nos percorre
o silêncio é
uma mudez desbocada
uma palavra, um texto que
sem se dizer já foi dito.
Miguel Godinho
O silêncio não é vazio
penetra no mar de nós
navega por entre sentires
naufraga nas conjecturas
O silêncio é angular
uma estrada que não se conhece
um mapa desactualizado
um trilho que nos percorre
o silêncio é
uma mudez desbocada
uma palavra, um texto que
sem se dizer já foi dito.
Miguel Godinho
Subscrever:
Mensagens (Atom)