"Ilha de Tavira Resort"
Foi com alguma perplexidade que recebi a notícia da pretensão de construção de um aldeamento turístico na ilha de Tavira. Ou melhor, compreendo perfeitamente que perante um cenário natural de tal calibre, as intenções que não raras vezes guiam os interesses imobiliários se manifestem no sentido de rentabilizar aquele pequeno paraíso (ainda mais quando o mesmo é privado – como se verifica neste caso). O mal está nos riscos que tal pretensão acarreta.É verdadeiramente estranho e totalmente lamentável o facto dos institutos competentes, em tempo de suposto (e aparente) corte com o crescimento desmedido e desregrado das construções que surgem como cogumelos um pouco por todo o litoral algarvio (ultimamente até nas zonas que se julgavam protegidas), continuem a viabilizar projectos que nos façam questionar as verdadeiras intenções dos muitos planos que (supostamente) regulam a natureza e a sua relação com o mercado imobiliário. Como é possível que, numa altura em que se pretende destruir construções que impedem o correcto “funcionamento” da Natureza, surja uma intenção de aprovação de um projecto destes quer por parte quer do Instituto de Conservação da Natureza, quer por parte do Parque Natural da Ria Formosa? No mínimo, e até por uma questão de coerência lógica e opinativa, quando se quer regrar, negando a edificação, não se aprovam projectos em zonas sensíveis, por menores que sejam os riscos para o meio natural.Desde que me lembro, a Ilha de Tavira serve um tipo de turismo que não pretende uma cama de Hotel. É certo que em parte porque ela não existe, mas quem a quer, consegue-a facilmente nas imediações, podendo frequentar da mesma forma a praia. O turismo que recorre à tenda também existe e também há quem o pratique, quer por necessidade, quer por opção. E o chamado “eco-turismo” não passa unicamente por construir um Hotel e um SPA junto a um parque natural. Felizmente ainda existe quem goste de acampar.Pelos vistos, o Algarve ainda não aprendeu que para ter um turismo de qualidade, é necessário respeitar os vários tipos de turismo que existem, proporcionando resposta para todos eles.Se o Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) para o Sotavento Algarvio previa um programa de intervenção para aquela zona, deveria ter sido especificado que seriam o parque de campismo e as zonas de apoio a sofrer as alterações necessárias com a finalidade de melhorar as condições. Até porque a não especificação do tipo de alterações que devem ser feitas em zonas desta sensibilidade, geralmente abrem portas de acção que na maioria das vezes não são as mais correctas e/ou adequadas. Temos no presente caso da ilha de Tavira o exemplo perfeito. Com certeza que a construção de um aldeamento, de um Hotel, bungallows, SPA, moradias, e a deslocação do parque de campismo para a zona nascente da ilha, como que se de uma “expropriação” se tratasse, esta não mais seria a mesma. Não sejamos ingénuos… Já deveríamos ter aprendido com aquilo que se passou e (infelizmente) se vai passando um pouco por todo o litoral… Até porque não devem ser exclusivamente os endinheirados a ter direito de usufruto das zonas privilegiadas...
Artigo publicado no jornal "Público" em 08/08/2005
Miguel Godinho
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