quarta-feira, julho 31, 2013

a inocência a regressar

a inocência perdemo-la quando o rigor do mundo nos explode na cara, aos dezanove, no dia em que o nosso primeiro grande amor nos transmite a mais dura das verdades: «já não te amo», quando alguém próximo nos parte e ficamos desamparados sabendo que nunca mais seremos os mesmos sem a presença dessa pessoa, quando percebemos que o mundo é hipócrita, que as pessoas são feitas de duplicidades e dissimulações e nós nunca teremos a capacidade, as ferramentas para lidar com isso, quando nos apercebemos da vertigem da vida na constatação de que a partir desse momento passaremos a olhá-la ao contrário, procurando percorrê-la em percurso inverso, em contraciclo, tentando aproveitar todos os instantes porque mais ou cedo mais tarde tudo acaba, todos partem, tudo morre, não fica cá ninguém, e eis que então nos nasce o primeiro filho e tudo se altera, tudo volta a fazer sentido, renascemos nesse dia, o puto que nos irá chamar «papá», as lágrimas nos olhos porque essa palavra te atinge com uma brutalidade transcendente na cara, uma palavra que canta, a totalidade dessa palavra, a responsabilidade melodiosa que ela te transmite, «papá: anda», e tu andas, «papá: dá», e tu dás, «papá: dança», e tu danças, e parece que refloresces, e percebes o caminho que tens de percorrer, o sentido das coisas, a inocência a regressar - transformada - mas a inocência a regressar
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mg 2013

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