Queria ser o que escrevo. Entretanto vou-me contentando em escrever o que sou.
Miguel Godinho
quinta-feira, outubro 23, 2008
segunda-feira, outubro 06, 2008
A metamorfose
A metamorfose geralmente acontece na segunda metade
dos vintes, quando nos apercebemos da absoluta necessidade
de morrer um dia, quando começa a apetecer
a toda a hora gritar que estamos atulhados e que queremos
a inocência de volta porque o silêncio interior
se torna já impossível de suportar e os incidentes antigos
complicados de esconder. De dois tipos as mutações,
qualquer um deles, de ingresso obrigatório: a perda definitiva
da limpidez e a transformação gradual do nosso ser numa coisa
que nunca mais olhará para trás sempre que a vida colocar
de frente a possibilidade de obter mais e mais e mais
e sempre mais, mesmo que para isso se torne necessário
recorrer à navalhada nas costas de alguém;
ou a passagem por um longo período de desnorte mas que
mais tarde poderá dar acesso ao paraíso do nosso ser onde
a toda a hora é possível para sempre ser o que quisermos ser,
e sê-lo despreocupados com o desenrolar da viagem,
extasiados pelos sonhos adolescentes que decidimos recuperar
e viver, conscientes da sua absoluta necessidade, custe o que
custar, doa a quem doer. Há no entanto, um terceiro caminho,
que evita qualquer um dos primeiros: arrematar-se a viagem,
fechando os olhos e dormindo para sempre na quietude
do silêncio eterno, protegidos da violência da memória
e da necessidade de mutações.
Miguel Godinho
A metamorfose geralmente acontece na segunda metade
dos vintes, quando nos apercebemos da absoluta necessidade
de morrer um dia, quando começa a apetecer
a toda a hora gritar que estamos atulhados e que queremos
a inocência de volta porque o silêncio interior
se torna já impossível de suportar e os incidentes antigos
complicados de esconder. De dois tipos as mutações,
qualquer um deles, de ingresso obrigatório: a perda definitiva
da limpidez e a transformação gradual do nosso ser numa coisa
que nunca mais olhará para trás sempre que a vida colocar
de frente a possibilidade de obter mais e mais e mais
e sempre mais, mesmo que para isso se torne necessário
recorrer à navalhada nas costas de alguém;
ou a passagem por um longo período de desnorte mas que
mais tarde poderá dar acesso ao paraíso do nosso ser onde
a toda a hora é possível para sempre ser o que quisermos ser,
e sê-lo despreocupados com o desenrolar da viagem,
extasiados pelos sonhos adolescentes que decidimos recuperar
e viver, conscientes da sua absoluta necessidade, custe o que
custar, doa a quem doer. Há no entanto, um terceiro caminho,
que evita qualquer um dos primeiros: arrematar-se a viagem,
fechando os olhos e dormindo para sempre na quietude
do silêncio eterno, protegidos da violência da memória
e da necessidade de mutações.
Miguel Godinho
sábado, outubro 04, 2008
Os nossos dias (20)
(no regresso a casa, ao fim do dia,
gostamos sempre de reflectir um pouco
sobre mais este dia com que Deus nos abençoou
enquanto não chegamos para comer, dormir e esquecer)
Um dia atrás do outro a caminhar errantes
pelo trilho da cegueira
ultimamente são assim os nossos dias
trajados de um veludo rasgado
num anseio constante
por um devir melhor preenchido
nada mais falhado que esperar
pelos efeitos da luz dos dias
tudo isso se consome
pouco tempo depois de nascer
Aquilo que mais cedo ou mais tarde
acabamos por descobrir
é que apenas nos dão permissão
para marchar descalços
num chão repleto de vidros
As ilusões – os dias são feitos disso
e a penumbra – porquê que ninguém fala disso? Da distância
que nos separa do sonho inocente
(o Sr. Engenheiro acha que faz parte da sua função
limitar-nos a liberdade de raciocínio
e o Sr. Doutor também se sente na obrigação
de nos impor regras nas convicções
cada vez mais formatadas, como convém
a pretexto de mais um projecto
de relevada importância. Queria, antes de mais,
deixar o meu apreço a esses senhores
tão importados em ensinar-nos
um pouco de etiqueta comportamental)
Os nossos dias são cinzentos
mas vivemos e calamos
como que com medo
vá-se lá saber do quê
talvez de nos descobrirmos
no meio do esterco
Miguel Godinho
(no regresso a casa, ao fim do dia,
gostamos sempre de reflectir um pouco
sobre mais este dia com que Deus nos abençoou
enquanto não chegamos para comer, dormir e esquecer)
Um dia atrás do outro a caminhar errantes
pelo trilho da cegueira
ultimamente são assim os nossos dias
trajados de um veludo rasgado
num anseio constante
por um devir melhor preenchido
nada mais falhado que esperar
pelos efeitos da luz dos dias
tudo isso se consome
pouco tempo depois de nascer
Aquilo que mais cedo ou mais tarde
acabamos por descobrir
é que apenas nos dão permissão
para marchar descalços
num chão repleto de vidros
As ilusões – os dias são feitos disso
e a penumbra – porquê que ninguém fala disso? Da distância
que nos separa do sonho inocente
(o Sr. Engenheiro acha que faz parte da sua função
limitar-nos a liberdade de raciocínio
e o Sr. Doutor também se sente na obrigação
de nos impor regras nas convicções
cada vez mais formatadas, como convém
a pretexto de mais um projecto
de relevada importância. Queria, antes de mais,
deixar o meu apreço a esses senhores
tão importados em ensinar-nos
um pouco de etiqueta comportamental)
Os nossos dias são cinzentos
mas vivemos e calamos
como que com medo
vá-se lá saber do quê
talvez de nos descobrirmos
no meio do esterco
Miguel Godinho
Aqui vos deixo o texto que resultou da apresentação do 1º livro de poesia do Pedro Afonso, "Ainda aqui este lugar".
Ainda aqui este lugar
É com grande orgulho que assisto à edição do primeiro livro de poesia deste grande amigo, de longa data, que é o Pedro Afonso. Este jovem e emergente poeta algarvio nasceu em Faro, em 1979, e é licenciado em Línguas e Literaturas Modernas. É um dos membros fundadores do sulscrito, círculo literário do Algarve, faz parte da direcção editorial da revista literária Sulscrito e está representado na Antologia de Novos Poetas Algarvios – Do Solo ao Sul, editada pela ARCA (2006), na Antologia de Poesia Portuguesa Actual – Poema Poema, editada em Espanha (traduzido para castelhano) e na Primeira Antologia de Micro-Ficção Portuguesa, editada pela Exodus, em 2008. Publica ainda regularmente no blogue A pedra, que mantém desde 2007.
Sou amigo do Pedro desde os onze / doze anos, desde o tempo em que começámos a questionar o mundo. Frequentámos a mesma escola preparatória e desde então tornámo-nos fortes amigos, atravessando juntos os momentos mais interessantes das nossas vidas – a adolescência, a juventude. Quase a partir do momento em que nos conhecemos, passámos a reunir-nos frequentemente para descobrir e partilhar a vida, as ilusões e as desilusões, os sucessos e os insucessos, as felicidades e as infelicidades de cada um. Apercebi-me desde logo que uma das características que melhor define a sua personalidade é a necessidade constante de se questionar, e, nesse sentido, de se enfrentar e/ou de se confrontar, quer para testar e perceber os seus limites e/ou limitações, quer para perceber o que há para além deles/as. Por isso mesmo, contava já que, de alguma forma, este livro que agora publica, seguisse essa mesma atitude.
“Ainda aqui este lugar” é um conjunto de poemas que se apresenta reunido numa obra de confrontação entre dois eus que existem em dois momentos temporais distintos, o eu-de-agora e o eu-de-ontem, mas que se confrontam no plano liso da percepção mental (onde não existe uma noção de ontem, de hoje ou de amanhã - conceitos normalmente entendidos de forma autónoma e separados entre si). Veja-se o excerto do poema da pág. 17 (“o mundo é um novelo na minha memória lisa”). O presente é pensado aqui em confronto com o passado, mas numa tábua lisa/plana de continuidade perceptiva – o agora, onde os conceitos de passado e presente se juntam num só, conforme referia atrás. Talvez por isso, o passado não tenha neste livro uma expressão rigorosa, um momento exacto, já que no livro não se verifica uma única referência a um momento específico do passado.
Assim sendo, este é, também, um livro de memória mas não de memórias, uma abordagem ao que foi e que não volta a ser da mesma forma (essa certeza transparece ao longo de toda a obra - há uma plena consciência disso mesmo), as imagens com que esse passado se faz representar hoje em dia e o efeito que elas produzem no entendimento da vida.
O método empregue para o objectivo proposto - o de se tentar compreender o presente olhando para o passado - revela-se extremamente semelhante ao método arqueológico. Veja-se o excerto do poema presente na pág. 47: “(…) assim procuro por debaixo das minhas / raízes onde cotão e memórias crescem / mas nada por lá está onde é possível ver / há coisas que caem e aparecem no sentir / onde os olhos e o faro não trabalham no saber”. Note-se aqui, conforme se referia atrás, essa clara ideia de reinvenção da memória. Em todo o caso, o acto de revisitação conduz-nos sempre a uma reinvenção, e logicamente a uma reinscrição – a chave para a compreensão do livro e a justificação para o próprio título do mesmo – “Ainda aqui este lugar”. Esse lugar que o título aponta não é um lugar físico, é antes um lugar abstracto: é o lugar da memória que continuará a ser continuamente e continuadamente visitado e a ser apreendido e concebido de forma diferente.
A finalidade deste livro é, quanto a mim, a tentativa de um posicionamento mais sólido no momento presente, a compreensão de quem se é hoje, através de um mergulho na memória (o confronto).
Justamente como referia atrás, e tal como numa escavação arqueológica, o método empregue aqui é o da demarcação do terreno/território afectivo e/ou emocional, através da aplicação de uma quadrícula bem definida nos elementos que compõem esse território afectivo, para, de seguida, se prosseguir para o estudo pormenorizado de cada um deles - as 4 estruturas / partes que dividem a obra:
A moradia – que, quanto a mim, traduz o emaranhado emocional onde agora nos movemos (veja-se o excerto do poema da pág. 25 “a mesa espera-te posta / a cada manhã lucente / e o que nela se acumula / são os restos depostos / de uma humanidade”);
O muro – traduzindo talvez a distância / o tempo (pág. 9 “já só a sombra daquele fogo / na distância que se adensa / ou talvez as mãos ainda sujas / que atravessam regressando / do fumo o toque resistente / inflamado na pele fresca da infância / talvez de pedras brancas erigido / um muro que te corte a memória / e te guie as águas rápidas / pela rua da qual o reflexo vigio”);
A casa ao fundo – talvez as primeiras emoções, aquilo que facilmente se dissipa da memória (pág.51 “(…) o rápido brilho secreto / de uma evaporação absoluta / aqui / resta a sombra / das coisas em queda”);
A imitação do jardim – o que se consegue recuperar através desse revisitar da memória / das memórias – (pág. 39 “o sol rasga por entre as árvores / um tigrado exótico no chão do jardim / pombos pavões patos passos de flor / e de dentro de um arbusto móvel / sai uma coisa qualquer viva de sangue / se ficam pegadas neste chão tão ido / é porque alguém lhes segue a sombra”).
Portanto, aquilo que o Pedro faz é “desentulhar” as sucessivas camadas de terra e de pó para, por fim, deixar á vista a estrutura que o define hoje em dia e que foi sendo engrandecida e/ou empobrecida ao longo do tempo: a “moradia” onde hoje habita. Veja-se o poema da pág.30: “É neste corredor cego / de atravessar os dias / que os pesadelos nos tocam / as pestanas vivos na escuridão / um sangue escorrido / que te acompanha o frio / pegadas do teu corpo sempre”.
Assim sendo, “ainda aqui este lugar” é uma declaração de que somos o resultado de sucessivas camadas sensitivas, de um amontoado de experiências acumuladas ao longo da vida. E sendo este um tema tão difícil de ser expresso verbalmente, este é, também por isso, um livro compacto, de uma densidade absoluta. Aludindo a uma das nossas referências adolescentes, diria mesmo que aquilo que o Pedro procura transmitir é que “o que éramos ainda somos, mas o que somos, não sabemos”.
Assim sendo, queria por último deixar uma palavra de apreço à editora “4 águas” que tornou possível este livro e que, da mesma forma, também hoje aqui se estreia na sua actividade editorial, ao Fernando Esteves Pinto e ao Victor Cardeira pela excelente iniciativa que teve no sentido de contribuir para a expressão dos autores algarvios e, mais uma vez dar os parabéns a este grande amigo que é o Pedro Afonso e desejar-lhe o maior sucesso na sua carreira literária que agora, com a edição deste livro, adquire um novo fôlego.
Miguel Godinho
É com grande orgulho que assisto à edição do primeiro livro de poesia deste grande amigo, de longa data, que é o Pedro Afonso. Este jovem e emergente poeta algarvio nasceu em Faro, em 1979, e é licenciado em Línguas e Literaturas Modernas. É um dos membros fundadores do sulscrito, círculo literário do Algarve, faz parte da direcção editorial da revista literária Sulscrito e está representado na Antologia de Novos Poetas Algarvios – Do Solo ao Sul, editada pela ARCA (2006), na Antologia de Poesia Portuguesa Actual – Poema Poema, editada em Espanha (traduzido para castelhano) e na Primeira Antologia de Micro-Ficção Portuguesa, editada pela Exodus, em 2008. Publica ainda regularmente no blogue A pedra, que mantém desde 2007.
Sou amigo do Pedro desde os onze / doze anos, desde o tempo em que começámos a questionar o mundo. Frequentámos a mesma escola preparatória e desde então tornámo-nos fortes amigos, atravessando juntos os momentos mais interessantes das nossas vidas – a adolescência, a juventude. Quase a partir do momento em que nos conhecemos, passámos a reunir-nos frequentemente para descobrir e partilhar a vida, as ilusões e as desilusões, os sucessos e os insucessos, as felicidades e as infelicidades de cada um. Apercebi-me desde logo que uma das características que melhor define a sua personalidade é a necessidade constante de se questionar, e, nesse sentido, de se enfrentar e/ou de se confrontar, quer para testar e perceber os seus limites e/ou limitações, quer para perceber o que há para além deles/as. Por isso mesmo, contava já que, de alguma forma, este livro que agora publica, seguisse essa mesma atitude.
“Ainda aqui este lugar” é um conjunto de poemas que se apresenta reunido numa obra de confrontação entre dois eus que existem em dois momentos temporais distintos, o eu-de-agora e o eu-de-ontem, mas que se confrontam no plano liso da percepção mental (onde não existe uma noção de ontem, de hoje ou de amanhã - conceitos normalmente entendidos de forma autónoma e separados entre si). Veja-se o excerto do poema da pág. 17 (“o mundo é um novelo na minha memória lisa”). O presente é pensado aqui em confronto com o passado, mas numa tábua lisa/plana de continuidade perceptiva – o agora, onde os conceitos de passado e presente se juntam num só, conforme referia atrás. Talvez por isso, o passado não tenha neste livro uma expressão rigorosa, um momento exacto, já que no livro não se verifica uma única referência a um momento específico do passado.
Assim sendo, este é, também, um livro de memória mas não de memórias, uma abordagem ao que foi e que não volta a ser da mesma forma (essa certeza transparece ao longo de toda a obra - há uma plena consciência disso mesmo), as imagens com que esse passado se faz representar hoje em dia e o efeito que elas produzem no entendimento da vida.
O método empregue para o objectivo proposto - o de se tentar compreender o presente olhando para o passado - revela-se extremamente semelhante ao método arqueológico. Veja-se o excerto do poema presente na pág. 47: “(…) assim procuro por debaixo das minhas / raízes onde cotão e memórias crescem / mas nada por lá está onde é possível ver / há coisas que caem e aparecem no sentir / onde os olhos e o faro não trabalham no saber”. Note-se aqui, conforme se referia atrás, essa clara ideia de reinvenção da memória. Em todo o caso, o acto de revisitação conduz-nos sempre a uma reinvenção, e logicamente a uma reinscrição – a chave para a compreensão do livro e a justificação para o próprio título do mesmo – “Ainda aqui este lugar”. Esse lugar que o título aponta não é um lugar físico, é antes um lugar abstracto: é o lugar da memória que continuará a ser continuamente e continuadamente visitado e a ser apreendido e concebido de forma diferente.
A finalidade deste livro é, quanto a mim, a tentativa de um posicionamento mais sólido no momento presente, a compreensão de quem se é hoje, através de um mergulho na memória (o confronto).
Justamente como referia atrás, e tal como numa escavação arqueológica, o método empregue aqui é o da demarcação do terreno/território afectivo e/ou emocional, através da aplicação de uma quadrícula bem definida nos elementos que compõem esse território afectivo, para, de seguida, se prosseguir para o estudo pormenorizado de cada um deles - as 4 estruturas / partes que dividem a obra:
A moradia – que, quanto a mim, traduz o emaranhado emocional onde agora nos movemos (veja-se o excerto do poema da pág. 25 “a mesa espera-te posta / a cada manhã lucente / e o que nela se acumula / são os restos depostos / de uma humanidade”);
O muro – traduzindo talvez a distância / o tempo (pág. 9 “já só a sombra daquele fogo / na distância que se adensa / ou talvez as mãos ainda sujas / que atravessam regressando / do fumo o toque resistente / inflamado na pele fresca da infância / talvez de pedras brancas erigido / um muro que te corte a memória / e te guie as águas rápidas / pela rua da qual o reflexo vigio”);
A casa ao fundo – talvez as primeiras emoções, aquilo que facilmente se dissipa da memória (pág.51 “(…) o rápido brilho secreto / de uma evaporação absoluta / aqui / resta a sombra / das coisas em queda”);
A imitação do jardim – o que se consegue recuperar através desse revisitar da memória / das memórias – (pág. 39 “o sol rasga por entre as árvores / um tigrado exótico no chão do jardim / pombos pavões patos passos de flor / e de dentro de um arbusto móvel / sai uma coisa qualquer viva de sangue / se ficam pegadas neste chão tão ido / é porque alguém lhes segue a sombra”).
Portanto, aquilo que o Pedro faz é “desentulhar” as sucessivas camadas de terra e de pó para, por fim, deixar á vista a estrutura que o define hoje em dia e que foi sendo engrandecida e/ou empobrecida ao longo do tempo: a “moradia” onde hoje habita. Veja-se o poema da pág.30: “É neste corredor cego / de atravessar os dias / que os pesadelos nos tocam / as pestanas vivos na escuridão / um sangue escorrido / que te acompanha o frio / pegadas do teu corpo sempre”.
Assim sendo, “ainda aqui este lugar” é uma declaração de que somos o resultado de sucessivas camadas sensitivas, de um amontoado de experiências acumuladas ao longo da vida. E sendo este um tema tão difícil de ser expresso verbalmente, este é, também por isso, um livro compacto, de uma densidade absoluta. Aludindo a uma das nossas referências adolescentes, diria mesmo que aquilo que o Pedro procura transmitir é que “o que éramos ainda somos, mas o que somos, não sabemos”.
Assim sendo, queria por último deixar uma palavra de apreço à editora “4 águas” que tornou possível este livro e que, da mesma forma, também hoje aqui se estreia na sua actividade editorial, ao Fernando Esteves Pinto e ao Victor Cardeira pela excelente iniciativa que teve no sentido de contribuir para a expressão dos autores algarvios e, mais uma vez dar os parabéns a este grande amigo que é o Pedro Afonso e desejar-lhe o maior sucesso na sua carreira literária que agora, com a edição deste livro, adquire um novo fôlego.
Miguel Godinho
quarta-feira, outubro 01, 2008
Os nossos dias (19)
Podes até sentir-te absoluto na imensa
frescura dos dias que se sucedem
mas a febre que te assola sempre que te
descobres por detrás dos processos
pousados na prateleira é suficiente
para te desaprumar o corpo e é precisamente
aí que acordas da dormência diária
para ver a luz ao fim do túnel
(Sem aviso prévio, a porta abre-se e não tens tempo para terminar o pensamento onde o poema se estava a desenhar)
Sim, senhor engenheiro, em que posso ajudá-lo?
Claro que sim, às quatro terei o procedimento revisto
Na impossibilidade de regresso ao poema
um cafezinho ao fundo das escada
- é só mais uma manhã onde te encontras
e depois te perdes
Miguel Godinho
Podes até sentir-te absoluto na imensa
frescura dos dias que se sucedem
mas a febre que te assola sempre que te
descobres por detrás dos processos
pousados na prateleira é suficiente
para te desaprumar o corpo e é precisamente
aí que acordas da dormência diária
para ver a luz ao fim do túnel
(Sem aviso prévio, a porta abre-se e não tens tempo para terminar o pensamento onde o poema se estava a desenhar)
Sim, senhor engenheiro, em que posso ajudá-lo?
Claro que sim, às quatro terei o procedimento revisto
Na impossibilidade de regresso ao poema
um cafezinho ao fundo das escada
- é só mais uma manhã onde te encontras
e depois te perdes
Miguel Godinho
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