Imagens mentais
No seguimento do que afirmou hoje Fernando Belo no Público e do que Ana Gerschenfeld expôs há uns dias no mesmo diário, fica bem claro aos meus olhos o romantismo existente nas ridicularidades que se formam em torno da necessidade constante em anunciar novos progressos científicos. Um bom exemplo é o caso das tão faladas “imagens mentais” e das investigações que se desenvolvem actualmente em torno do tema.
Procura demonstrar-se nos dias que correm que, “utilizando apenas a análise dos padrões de actividade cerebral gerados pelo visionamento de imagens naturais”, será possível no futuro “identificar, com grande precisão, a(s) imagem(ns) que o cérebro humano está a ver”. Pretende-se com isto vir a tornar possível a constituição de um modelo matemático que permita identificar os padrões dos registos mentais (as imagens) formados aquando do visionamento de uma qualquer representação gráfica (uma fotografia, por ex.).
Nunca será, no entanto, possível, uma “descodificação” da memória ou da imaginação como se pretende fazer crer. Uma coisa são as representações que o cérebro forma a partir de uma qualquer imagem, outra coisa é o discurso que é produzido (e que é imperceptível do ponto de vista da representação gráfica - porque com múltiplas interpretações) em torno dessa mesma imagem. De qualquer forma, cada discurso está dependente da aprendizagem individual e isso, naturalmente, varia de indivíduo para indivíduo. Não se vai conseguir no futuro traduzir um registo cerebral das ideias, dos juízos, das concepções mentais, do discurso formado (ou por formar) em torno de algo, precisamente porque isso depende do percurso biográfico de cada um, embora isso pudesse parecer uma óptima ideia para alguns… O primeiro estímulo cerebral (a imagem) perante uma tela de Baskiat pode ser a mesma, quer para mim, quer para a minha mãe (que percebe tanto de arte contemporânea como o Padre Alberto – talvez um misto de excitação e desconforto) mas de certeza que o discurso produzido, a interpretação, a transformação operada pela apreensão ajudada pela linguagem e pelo discurso inquisitivo não serão com certeza os mesmos…
Miguel Godinho
No seguimento do que afirmou hoje Fernando Belo no Público e do que Ana Gerschenfeld expôs há uns dias no mesmo diário, fica bem claro aos meus olhos o romantismo existente nas ridicularidades que se formam em torno da necessidade constante em anunciar novos progressos científicos. Um bom exemplo é o caso das tão faladas “imagens mentais” e das investigações que se desenvolvem actualmente em torno do tema.
Procura demonstrar-se nos dias que correm que, “utilizando apenas a análise dos padrões de actividade cerebral gerados pelo visionamento de imagens naturais”, será possível no futuro “identificar, com grande precisão, a(s) imagem(ns) que o cérebro humano está a ver”. Pretende-se com isto vir a tornar possível a constituição de um modelo matemático que permita identificar os padrões dos registos mentais (as imagens) formados aquando do visionamento de uma qualquer representação gráfica (uma fotografia, por ex.).
Nunca será, no entanto, possível, uma “descodificação” da memória ou da imaginação como se pretende fazer crer. Uma coisa são as representações que o cérebro forma a partir de uma qualquer imagem, outra coisa é o discurso que é produzido (e que é imperceptível do ponto de vista da representação gráfica - porque com múltiplas interpretações) em torno dessa mesma imagem. De qualquer forma, cada discurso está dependente da aprendizagem individual e isso, naturalmente, varia de indivíduo para indivíduo. Não se vai conseguir no futuro traduzir um registo cerebral das ideias, dos juízos, das concepções mentais, do discurso formado (ou por formar) em torno de algo, precisamente porque isso depende do percurso biográfico de cada um, embora isso pudesse parecer uma óptima ideia para alguns… O primeiro estímulo cerebral (a imagem) perante uma tela de Baskiat pode ser a mesma, quer para mim, quer para a minha mãe (que percebe tanto de arte contemporânea como o Padre Alberto – talvez um misto de excitação e desconforto) mas de certeza que o discurso produzido, a interpretação, a transformação operada pela apreensão ajudada pela linguagem e pelo discurso inquisitivo não serão com certeza os mesmos…
Miguel Godinho
1 comentário:
Caro Miguel,
Não tive a oportunidade de ler os artigos que mencionas no texto no entanto, e mesmo sem conhecer o conteúdo destes, gostava de expressar o meu ponto de vista em relação ao teu texto, que em parte é motivado por esses artigos.
Vou-te apresentar um caso prático desses desenvolvimentos científicos, falando na primeira pessoa. Neste momento estou de volta à UALG como investigador e possivelmente também como doutorando, na área da visão activa, que estuda a modelação e processamento do cortex cerebral e procura implementar modelos matemáticos que o simulem. Qual o objectivo, perguntas. Ele é simples. Digamos que a evolução do conhecimento em processamento de imagem clássico chegou praticamente ao término. Os investigadores começam a virar-se para outras formas de concretização do mesmo objectivo: a obtenção de informação visual e seu processamento.
O objectivo não é simular de forma fiel o funcionamento do cérebro, mas sim procurar dentro da máquina humana soluções para serem aplicadas no dia-a-dia através de máquinas criadas pelo ser humano. O objectivo não é criar um modelo que permita a máquina sintética "apreciar" uma pintura de Baskiat mas sim que torne mais simples e real o desempenho de funções triviais como a locomoção através de obstáculos ou ao auxilio visual a pessoas com deficiência deste sentido.
Em termos práticos, e falando do meu trabalho, no plano mais fundamental, o cérebro de todos nós funciona de igual forma. Os diversos módulos que processam os pontos, as linhas, as arestas, as texturas, as formas, o espaço, a luz e sombra, etc. é igual para todos. E é neste ponto que os cientistas ainda se encontram. Obviamente que o pensamento critico e não linear do ser humano é impossível de replicar numa máquina. Elas são incapazes de filosofar, apenas "mastigar números". E concordo contigo quando dizes que cada pessoa tem a sua reacção própria a um mesmo estímulo visual. mas repara, considerando duas máquinas em que as suas redes neuronais são "educadas" de modo diferente existe sempre uma grande probabilidade das duas classificarem um mesmo estimulo de modo não igual.
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