terça-feira, fevereiro 21, 2006


Locais sem lei

Existem sítios no Algarve (e com certeza em muitos mais locais do país) onde as leis que regulamentam os licenciamentos de construção se encontram apenas sujeitas à aprovação dos municípios que oferecerem melhores condições para o cumprimento dos objectivos de quem quer construir. E é só escolher entre dois, com sorte três ou quatro, conforme o número de concelhos que constituem a fronteira onde esses terrenos se encontrem situados. São aquilo que se poderia chamar de terrenos sem lei, parcelas de terreno que estão localizadas em zonas nebulosas, algo obscuras, zonas situadas num limbo capaz de destruir o conceito de “clandestinidade”, pela sua inequívoca capacidade de equivocar. Terrenos ambíguos pelas suas margens de manobra, mas inocentes pela indefinição geográfica.
A deficiente organização do nosso território traz por vezes ao de cima situações bastante interessantes no que toca às suas não-tutelas administrativas. Desta vez, o palco da acção localiza-se à saída de Faro, ou à entrada de Loulé (entenda-se como convier), junto ao restaurante Austrália. Ao que parece, aquilo que se pretende é que aquele sítio venha a albergar o novo stand da Fialgar, licenciando-o enquanto inserido numa acção justificada pela necessidade de remodelação e ampliação das instalações industriais da empresa Madeisul, Lda. O município de Loulé deu luz vermelha aos trabalhos após verificar que as obras já estavam em andamento (sem licença desta autarquia). No entanto, o município de Faro já tinha dado luz verde por entender que o terreno estava abrangido pelo seu PDM. Qual das vereações tem poder para decidir sobre esta questão quando se descobre que os PDM’s destas duas autarquias se sobrepõem?
A juntar ao problema de indefinição da tutela, deve dizer-se que aquele terreno se encontra inserido numa zona classificada como Reserva Agrícola Nacional. Já não toco neste assunto porque quem conhece aquela zona, observa perfeitamente que não existem batatas naqueles terrenos mas sim quantidades imensas de automóveis a necessitar de serem podados. Ainda assim, no PDM de Faro, lê-se que aquela área “consta como zona interdita a actividades não ligadas à agricultura, mas admite actividades ligadas ao licenciamento industrial”. Manobra muito difícil de contornar, pelo menos no meu entendimento.
No entanto, aquela que me parece a questão central, consiste na tentativa de deslindar que município tem a obrigação de definir o licenciamento e em que moldes tal se pode efectuar. É certo que o PROTAL virá ajudar a clarificar a questão, mas até lá, como solucionar o problema?
Deverá ainda dizer-se que no local onde actualmente se localiza a Fialgar (junto ao Teatro Municipal de Faro) virá a nascer um Hotel. Portanto, temos aqui três elementos extremamente importantes na consumação de todo este processo: 1) a vontade de nascimento de um Hotel; 2) a necessidade de transferência de local de uma empresa para a implantação do Hotel e 3) a autorização no licenciamento de construção por parte de uma autarquia que não tem competências claramente definidas na matéria.
Convém por fim afirmar que não sou contra a construção, mas sim contra as intransparências e contra os limbos que por aí existem, para além de querer apenas alertar a população e as autarquias para o problema na falta de organização e gestão do território.

Miguel Godinho

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