quinta-feira, setembro 12, 2013

os dias lácteos

já foram claros, os dias, lácteos, irreflectidos, já houve um tempo em que era fácil compreender a luminosidade das horas, em que todos os minutos podiam trazer coisas novas. tudo isso naturalmente terminou: a ideia de que nunca as rotinas haveriam de ter lugar, de que nada se extinguiria, que o primeiro amor seria para a vida, mas porque é que o primeiro amor nunca é para a vida, como é que as certezas se tornaram tão frágeis, como é que a realidade passou a reflectir apenas a ausência, a falta de qualquer coisa – há sempre qualquer coisa que falta – onde é que anda agora aquela claridade que em tempos existiu, porque é que agora constantemente sentimos que já não somos os mesmos (quando nós nunca fomos sempre os mesmos), que nós já não somos aquela pessoa (se nós nunca fomos sempre aquela pessoa), como é que o silêncio agora está tão presente, o aflitivo ruído do silêncio, a insuficiência dos afectos, as frases sempre entre-cortadas, as meias-verdades que inundam o vazio dos espaços, a incapacidade em gerir as palavras, como é que se gere as palavras?, a certeza de que tudo tende para um fim, a consciência de que nada regressa ao mesmo lugar, que o amor é um conceito propenso ao desastre, que tudo há-de ser efémero, que a vida é uma transição, e eu sei lá o que é a vida: o que é mesmo a vida?, o que é mesmo a vida que eu cada vez percebo menos e nunca ninguém me chegou realmente a explicar?
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mg 2013

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