segunda-feira, outubro 29, 2007

terça-feira, outubro 23, 2007

Se ao menos conseguisse

Soluçava ele:
se ao menos conseguisse esquecer-te
como me esqueço de mim
arrancar da memória
o teu olhar
e o perfume
na brancura do silêncio
a tua presença, sempre a tua presença

e o corpo ardia-lhe
num êxtase nocturno:
(o suor nas costas)

se ao menos conseguisse esquecer-te
como me esqueço de mim

Miguel Godinho

quarta-feira, outubro 17, 2007

A dormência da tarde

Sentado
na mesa corrida
a brasa crepita
e o cheiro a sardinha
irrompe no ar.
O vinho caseiro descansa
no jarro estalado
e as sombras abrandam
a língua estendida
do cão a arfar.
É a cal que me ofusca
e uma turva visão tua
na dormência da tarde

Miguel Godinho

terça-feira, outubro 16, 2007

O que me punha sempre a pensar

O que me punha sempre a pensar
era o facto de saberes sempre as marés
mesmo que o cheiro metálico a mar
não te inundasse com a sua presença

do que melhor me lembro é do bigode
sujo de peixe fresco e de mim
a rir-me de ti enquanto a noite
na praia consumia o momento
esse, que a espuma das ondas datou

Miguel Godinho

domingo, outubro 14, 2007

O poeta inseguro II

Não se sentia realmente um poeta
porque pensava nunca encontrar
as palavras certas. Não conseguia ser objectivo
vendo-se frequentemente à deriva
na folha em branco, perdido no papel,
em busca das ideias.

Talvez ser poeta não fosse mais que isso:
um conquistador da percepção
um escultor de realidades, um idiota
sem catálogos à disposição,
um apóstolo das incertezas.

Ainda assim, desejava um dia
vir a experimentar o que imaginava sentir
um poeta poeta porque aí seria capaz
de exprimir o olhar sem hesitar,
sem sentir o erro nas palavras,
já que as palavras seriam o olhar
e o olhar não é impreciso

Miguel Godinho

sexta-feira, outubro 12, 2007



Torre AGBAR - Barcelona

Arquitecturas fálicas

Agosto 2007

quinta-feira, outubro 11, 2007

O poeta inseguro

O poeta inseguro olhava atento o mundo,
percorrendo todos os pormenores, qual leão faminto
que persegue a gazela, enquanto reparava
naqueles que a seu lado marchavam
sem a necessidade de cálculos pré-fabricados
para direccionar o olhar e escrever todos os instantes.
De novo, aquelas questões na sua cabeça:
Por que raio a convicção na verdade do olhar?
Para quê as repetidas notas sobre as coisas?
Não serão mais poéticos os instantes que se apagam
sem ninguém para os registar?

Miguel Godinho

quarta-feira, outubro 10, 2007

O olhar

Ele estava quimicamente alterado
pela embriaguês do momento.
Descobrira-lhe a inocência de repente

algures por entre o erotismo evidente
e a loucura feroz

de nada lhe valia tudo
o que aprendera até então
porque
o importante agora era apenas o olhar
desnudo e imoral numa bala
direita ao seu corpo
em busca do sangue

Miguel Godinho

segunda-feira, outubro 08, 2007


Em busca do vento


Círculos em busca do vento
que lento escorre o vapor
motor que gira e percorre
não morre sincero na bruma
esfuma a vontade de ver
morrer aqui de frente
para ti


Miguel Godinho

Caramulo - [Outubro 2007]