quarta-feira, dezembro 31, 2008

Pensamento para 2009

“There are two ways to conquer and enslave a nation.
One is by sword. The other is by debt.”

John Adams
1735-1826

sexta-feira, dezembro 26, 2008

Natal 2008

Relembro por uns instantes
por uns sumários instantes,
várias vezes, todos os dias
que há tanta gente como eu mesmo
para quem o Natal não é gáudio
para quem o Natal é fingimento
e tanto se me dá como se me deu

assim transponho a hipocrisia
esquecendo-me da solidão
e do carrinho que ninguém me pagou
da casinha que bem velhinho saldarei
dos muitos euros que já gastei
em ofertas que ninguém ligou

e por isso decidi embriagar-me este ano
de exultação, vinho e camarão
enterrado na elevação
repisando os sorrisos de todos os anos
destes Natais tão tacanhos
esquecendo a miséria
com uma valente borracheira

Miguel Godinho
Uma vida de sonho

Descrevia as suas façanhas como se só você existisse na plenitude. Uma casa desenhada por si mais parecia uma mansão e a aldeia, uma metrópole. Pintava-se de ouro para que o amassem na grandeza. Como se projectava grande aos seus próprios olhos, que imensidão, a sua miséria. Algo correu mal, Sr. Doutor Todos-os-Santos. Algo correu mal nessa sua corrida desenfreada por um sonho aparentemente com sentido. Algo correu mal, Sr. Doutor Todos-os-Santos, consigo e com a Sra. Doutora Todos-os-Santos. A sua filha agora cheira cocaína como aqueles carrinhos que aspiram as folhas caducas da Avenida da Liberdade nos meses de Outubro. Mas tudo bem. O Sr. Doutor desculpa e fecha os olhos na mesma proporção que abre a carteira. O seu filho estudou no colégio francês. Ainda que desde há muito tenha por hábito ir buscar os miúdos ao Parque Eduardo Sétimo para lhes oferecer uns pares de ténis. Todas as sextas-feiras. O Sr. Doutor desculpa e fecha os olhos na mesma proporção que abre a carteira. A vida não acabou da forma que esperava, Sr. Doutor. Descrevia as suas façanhas como se só você existisse na plenitude mas essa plenitude afinal não era tão plena assim, Sr. Doutor Que-se-fodam-todos-os-Santos. Deixe lá isso. Vale agora essa imagem que, ao longo dos anos, com tanto trabalho construiu. Ainda que ultimamente só pense numa coisa: arranjar uma arma e acabar com tudo.

Miguel Godinho

quinta-feira, dezembro 11, 2008

Os nossos dias (23)

Pouco a pouco vamos apodrecendo
na ilusão de sermos mais nós
sem nunca conseguirmos sê-lo em absoluto
O ritual de caminharmos sem destino
faz de nós uma indefinição
reflectida na confusão dos dias,
na verdade da derrota.
Conseguiremos algum dia
ser imunes ao fastio?
Nunca a fuligem das horas
foi tão óbvia quanto agora
A verdade é que ao olhar-me ao espelho
cada vez mais me demoro no vazio

Miguel Godinho